Na minha  ida habitual ao supermercado, fixei a prateleira dos livros da loja da entrada….e não resisti!

a fome de conhecimento  é sempre maior que a de comida….

Encarei com a capa da Nacional Geographic e fiquei vidrada!!

Emocionalmente é-me uma revista muito cara, lembro-me sempre de meu Pai, que a lia e colecionava… as Saudades crescem!

Depois, porque a temática fez tocar campainhas de um tema que me tem andado a ocupar os neurónios e a fazer emergir as primeiras lições de psicologia, que recordo com tanto afecto e que moldaram muito do meu percurso enquanto profissional

O que perdemos com a pandemia? (considerando os que já estavam na altura maturados;

O que não adquiriram, ou adquiriram diferente, os que pela tenra idade ainda estavam em maturação????

E os bébés Covid???

Ao ver o artigo da capa, o Poder do tacto de Cynthia Gorney, a primeira sensação que temos como bébés!!!!

(um dos sentidos que partilhamos com todos os outros animais)…. Veio tudo em catadupa, as aulas, os livros, as imagens e a paixão que então sentia por todas elas!

No Pós guerra ( 2ª guerra Mundial foram feitas várias experiências com crias humanas e não humanas,( hoje impossíveis de fazer dada a crueldade das mesmas!) que começaram com as experiências de Harlow hoje também postas em causa pelas conclusões “ abusivas que inferem para a espécie humana” mas que mostram a importância do contacto das crias de macacos reshus ( como se vê na figura abaixo, a cria entre duas “mães” artificiais e  apesar de só obter alimento da “mãe de arame”, é no entanto na de pelo que se agarra para se alimentar, mostrando a necessidade de conforto através do toque,  necessidade essencial no momento da alimentação…

 

 

 

René Spitz, autor que realizou um dos primeiros estudos sobre depressão infantil , em crianças que no pós guerra ficaram sem os seus pais….

 

Verificou que para as crianças, a privação das relações objetais no primeiro ano de vida era um fator prejudicial que poderia levar a sérios distúrbios emocionais (SPITZ, 1993).

 

As suas pesquisas foram registadas através de observações longitudinais de bebês com uso de vídeos, que contribuíram diretamente para a compreensão dos sintomas que ao longo do tempo foram observados e que denominou como anos mais tarde enfatiza a importância do afeto na relação entre mãe/cuidador e bebé, reconhecendo a relevância desse afeto durante a infância e que a partir do qual a consciência do bebé se desenvolve.

Estes bebés encontravam-se em instituições, onde, apesar de terem todas as necessidades de alimento, agasalho e higiene atendidas, ficavam privadas de amor, dado o grande número de crianças que ali se encontravam. Spitz observou que elas apresentavam inicialmente um período de choro, seguido de um estado de retraimento e indiferença, acompanhado de uma regressão no desenvolvimento e inúmeros sintomas somáticos.

 

Este estado foi denominado depressão anaclítica, expressão que significa depressão por perda de apoio. Quando a mãe aparecia antes do 5º mês de separação, a criança melhorava rapidamente. Caso contrário, o agravamento da depressão anaclítica podia levar ao marasmo, que se caracterizava por um aprofundamento do atraso motor, total falta de resposta a qualquer apelo, movimentos de dedos similares aos dos doentes catatônicos ou descerebrados.

A mortalidade em tais casos era de 37%. Um quadro semelhante pôde-se observar em crianças que tiveram uma hospitalização prolongada, na qual perderam o contato com os pais. Nestes casos, o mesmo conjunto de sintomas passou a ser conhecido como hospitalismo (Cf. MARCELLI, 1998,

Bolby fundamentando-se nestas experiências de privação, descrevem crianças de 5m a 3 anos, as 3 fases da falta da ligação (vínculo) – protesto, – chora inconsolavelmente procurando e chamando os pais; desespero –  quando recusa comer, vestir-se fechando-se em si mesma, não pedindo nada aos que a rodeiam;  e desapego ,_ em que aceitam cuidados, alimentação e brinquedos, e se reencontra a mãe, frequentemente não a reconhece, chora e desvia-se dela…

 

Winnicott percebeu que certos cuidados da mãe em relação à criança no simples segurá-lo, amamentá-lo, e acalentá-lo denominados como holding e handling, dependendo da maneira como são feitos, podem influenciar diretamente o desenvolvimento do bebé

A Pandemia, ameaça invisível, obrigou-nos a uma distância de segurança, – estranha esta denominação para animais grupais, com estreitos laços de proximidade –  agreste para quem se quer bem e tão pouco adaptativo em termos de sobrevivência!

 

A diminuir os contactos com os outros, incluindo membros da família, não residentes na mesma casa, (até os parabéns cantámos através dum ecrã qualquer sem bufar as velas, para não contaminar o bolo…) em contrapartida, confinando simultânea e desordenadamente em cubículos de betão,  membros da família numa coexistência de espaço e tempo, totalmente inabitual… Tendo havido em simultâneo, uma inversão completa de rotinas, obrigados a partilhar cubículos, enrolados, tipo sardinha em lata com a família nuclear, que normalmente saía de madrugada e só partilhava a casa à hora do jantar, disputando espaço, manias, computadores que não usávamos com horários impostos ou regras pré-definidas por ordens externas a esta mini estrutura social, numa imposição partilhada de não pôr o pé na rua… as boas regras do uso de écrans – tanto em trabalho como em lazer, até então com regras e tempos calculados e medidos assentes em estudos científicos sob o uso dos mesmos (até consoante a idade dos utilizadores- esquecidas ou atiradas fora, como se a máquina fosse a quase exclusiva forma de ver o outro ( pelo menos de cara inteira!!!) a andarmos mascarados e a “perfumarmo-nos” em excesso com álcool e outros desinfetantes, quais Tocs com o medo das contaminações….

 

 

Tocarmo-nos, fazer uma festa, um simples abraço…. passou a ser um gesto a evitar a todo o custo!

Até o velho “bacalhau “ foi remetido a prisão preventiva… e substituído por toque de cotovelos, de pés ( antes sapatos!) e até se chegou ao contacto de punho fechado que mais pareceram actos de agressão que de proximidade…

E fomos vivendo confinados, apartados dos convívios mais mundanos, saindo temerosos aos poucos, pezinhos de lã, ainda a medo, alguns, afoitos, outros, exaustos uns tantos mais…

E mesmo em casa, as festas as brincadeiras das cocegas e mimos….roubavam-nos tempos, para as desinfecções, as lavagens, o frio da limpeza a brilhar mas onde a natural “ bagunça” de uma casa com vida, desaparecia.

 

Uma a uma fomos perdendo todas as formas de saudar o outro, mais tradicionais ou mais ritualizadas, exitandono que fazer de outra forma, ou omitir….ou….simplesmente não deixar ser

 

Contrariamente às expectativas de muitos, as virtudes afundaram-se e o pior de todos nós emergiu em força desumanizando o pouco humanizado que ainda éramos

Entre tecnologia, desinfetantes e evitamentos o que resta desta sociedade doente….?